Moçambique

Lusa – Após as cheias

Após cheias, população volta às origens em Moçambique
19 Jan 2008

Lisboa, 19 Jan (Lusa) – Apesar da água contaminada, epidemias, habitações e produções agrícolas destruídas pelas enchentes, as comunidades das regiões Norte e Centro de Moçambique começam a retornar para os locais de origem.

O diretor da organização não-governamental portuguesa Oikos, João José Fernandes, disse à Agência Lusa que são várias “as conseqüências a longo e médio prazo” no país africano, incluindo problemas sociais, ambientais, econômicos e de saúde.

“Como as cheias são cíclicas e praticamente acontecem todos os anos, o desgaste dos solos é maior e, à mínima subida, as águas circulam com maior rapidez e violência”, afirmou, acrescentando que “todo o ecossistema é afetado”.

A entidade está em Moçambique desde 1991 e tem realizado trabalho de apoio junto da população afetada pelas inundações.
Neste ano, as enchentes em Moçambique já deixaram mais de 66 mil pessoas desalojadas. Parte da população afetada está em centros de alojamento, onde “há falta de condições de higiene”, segundo Fernandes.

Retorno
O diretor da OIKOS afirmou que “há um trabalho intenso de apoio no retorno das pessoas”, lembrando que no ano passado a organização ajudou no tratamento da água e na reabilitação do saneamento e das produções agrícolas.

Paralelamente, as organizações não-governamentais também sensibilizam as populações para que não voltem a construir as casas nas áreas de maior risco, facilmente inundadas, disse João José Fernandes.

Depois das inundações, as pessoas voltam às origens, onde os familiares sempre viveram e em que têm as suas pequenas propriedades, as machambas, disse à Lusa o antropólogo Beça Ribeiro.

“Não têm grandes alternativas se não regressarem para o local onde sempre viveram”, explicou o antropólogo, acrescentando que estas regiões, junto aos rios, são as que possuem as terras mais férteis.

Histórico
Em um artigo publicado recentemente, com o título “Regulação do fluxo do Rio Zambeze: que conseqüências?”, o biólogo Carlos Bento afirmou que o padrão de vida da população local “mudou bastante”.

“Antigamente a agricultura estava sincronizada com as cheias. Na época seca as populações viviam em acampamentos temporários e praticavam a agricultura nas áreas baixas, ricas em nutrientes trazidos pelas cheias da safra passada”, escreveu o biólogo.

Ainda segundo o especialista, “simultaneamente, pescavam e secavam o peixe que era a principal fonte de proteínas. No final da colheita as populações recolhiam os seus haveres para zonas altas onde se preveniam das cheias. Este ciclo acontecia todos os anos”.

Para o biólogo, nos últimos anos as populações “estabeleceram residências permanentes junto ao rio e em zona de inundações” e nos anos em que a barragem de Cahora Bassa liberta grandes quantidades de água “os danos humanos e materiais são avultados”.

Carlos Bento disse ainda que “o hábito de lidar com as cheias foi perdido ao longo do tempo pelas gerações subseqüentes à conclusão da barragem de Cahora Bassa”, que começou a funcionar em 1974.

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