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Resultados da Cimeira do Clima mostram a dissonância entre as pessoas e os políticos na emergência climática

Terminou a 25ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas em Madrid. A ZERO e a Oikos, as duas únicas organizações não-governamentais portuguesas presentes nos últimos dias na Cimeira em Madrid, fazem assim um balanço pouco positivo da reunião que terminou dois dias depois do inicialmente estabelecido.

Depois de um ano em que o mundo assistiu a uma mobilização sem precedentes pedindo urgência na ação climática, os líderes da COP25 falharam em intensificar a ação climática de acordo com o objetivo de 1,5 °C do Acordo de Paris. A ZERO e a Oikos consideram que existe uma falta de liderança política num processo que tem muitos países a criarem obstáculos e que tal limitou a ambição na COP25 em preparação para as decisões da COP26 em Galsgow.

 

A COP25 ofereceu aos governos a oportunidade perfeita para elaborar e particularizar (em detalhe) os seus planos para aumentar a ambição nacional climática até 2020. Esses planos deveriam descrever a resposta dos governos à emergência climática e à ciência climática e como iniciarão a transformação social. A ciência detalha claramente as terríveis consequências que os nossos sistemas sociais, económicos e naturais estão a enfrentar. Em Madrid consensualizou-se um texto que as organizações não-governamentais consideram que cumpre apenas os mínimos mas que é melhor do que não ter havido acordo dando razão a quem está contra as políticas climáticas. Porém, percebeu-se que os governos não se esforçam ainda o suficiente para responder e mostrar aos seus cidadãos que planeiam tomar ações significativas e transformadoras na preparação para a concretização de metas a formalizar em 2020.

 

Atolados por negociações de má-fé que colocam a política e os interesses dos combustíveis fósseis acima das pessoas e do planeta, muitos países – liderados pelos Estados Unidos, Austrália e Brasil – mais uma vez expuseram a sua apatia ao sofrimento de milhões e uma rejeição voluntária da ciência. A diferença entre o que as pessoas exigem por um futuro seguro para o clima e o que os líderes estão dispostos a fazer é cada vez maior à medida que as emissões aumentam, a produção de combustíveis fósseis se expande e os impactos são mais dramáticos.

 

Os principais emissores recuaram nos compromissos de aumentar a ambição até 2020 e os países ricos recusaram a promessa de fornecer financiamento para perdas e danos.

Relativamente aos mercados globais de carbono, um processo que ocupou grande parte das negociações Cimeira, sendo o único elemento que falta regulamentar do Acordo de Paris e que já vinha transferido do ano passado, não houve felizmente consenso. Estava em causa a integridade da redução real de emissões à escala global num processo que consideramos de utilidade duvidosa e de risco real para o incumprimento dos objetivos de Paris.

Dia 6 de dezembro, centenas de milhares de ativistas climáticos participaram num protesto pacífico onde fizeram ouvir as suas vozes bem alto, para além de outros protestos já perto das salas da Cimeira, enquanto os ministros se empurravam em negociações inconclusivas. É também profundamente preocupante que os grupos de observadores tenham sofrido severas retaliações nesta Cimeira por exigir justiça climática, enquanto muitos lobistas e poluidores percorrem livremente os corredores das Nações Unidas.

 

Entramos agora numa “década de ambição” que deve ter políticas transformadoras para manter a temperatura global subir abaixo de 1,5 graus Celsius. Os governos não podem ignorar a enorme mobilização global de opinião pública exigindo uma resposta urgente à crise climática. No ano passado, vimos a vontade do povo, especialmente da juventude, em diferentes partes do mundo.

 

A Europa

A já referida ausência de liderança negocial à escala mundial pressiona ainda mais a União Europeia a apresentar uma meta de redução de emissões para 2030 substancialmente mais alta no início de 2020 para convencer outros grandes emissores como a China e abrir caminho a um aumento da ambição global na COP26 do próximo ano em Glasgow. Durante a COP25, a UE disse repetidamente que deseja dar o exemplo. Para provar a sua sinceridade e liderança na implementação do Acordo de Paris, a UE precisa de aumentar substancialmente a sua promessa climática para 2030 através de metas de redução iguais ou preferencialmente mais elevadas que 55% entre 1990 e 2030, isto nos primeiros meses de 2020. A janela de oportunidade para se alcançar o objetivo de 1,5 °C do Acordo de Paris está rapidamente a fechar-se.

 

Na COP25, a UE repetiu também o seu compromisso de permanecer na Coligação de Elevada Ambição – um grupo de países que se comprometeram a apresentar uma nova meta climática para 2030 no primeiro trimestre de 2020.

Durante a COP25, a Bélgica duplicou a sua contribuição anterior para o Fundo Verde para o Clima de acordo com uma sua participação justa, contribuindo com 100 milhões de euros. Muitos países europeus, principalmente Itália, Espanha, Holanda e Áustria, apresentaram a sua disponibilidade para duplicar as suas contribuições. Alemanha, Noruega e Polónia fizeram contribuições para o Fundo de Adaptação.

 

Os países europeus devem reconhecer a emergência climática e apoiar os países em desenvolvimento a melhorar as suas promessas climáticas, continuando a ampliar o financiamento climático, em particular para adaptação, procurando contribuir para a meta anual de 100 mil milhões de dólares que entra em vigor em já em 2020.

 

Portugal

Portugal, através da participação do Primeiro-Ministro António Costa na Cerimónia de Abertura no dia 2 de dezembro e do Ministro do Ambiente no denominado segmento de alto nível na segunda semana de negociações, teve uma oportunidade soberana de mostrar um país ambicioso nas suas políticas climáticas, que dispõe de um Roteiro para Neutralidade Carbónica para 2050 e metas exigentes de redução de emissões para 2030, com fortes investimentos e resultados, nomeadamente nas energias renováveis, para além da antecipação do fim do uso de carvão na produção de eletricidade já para o ano de 2023.

 

Para as duas organizações, no que respeita a Portugal, é preciso acelerar o ritmo de implementação das políticas climáticas, antecipar objetivos e ser coerente nas ações para salvar o planeta de um aquecimento global excessivo. Ao mesmo tempo, as contradições entre os anúncios políticos e a realidade portuguesa ficaram de fora dos discursos. Se quisermos ser coerentes com a emergência climática é inadmissível: o avanço da exploração de gás natural na zona de Leiria/alcobaça; a considerável expansão das emissões da aviação com o aumento de oferta não pode ter lugar; a gestão florestal não pode continuar a permitir as grandes áreas ardidas que se verificam anualmente, o modelo de uma agricultura e agropecuária intensivas tem de ser evitado, para além da necessidade de inversão do paradigma de um crescimento económico que se afirma ter de continuar com prejuízos dramáticos para o ambiente.

 

No que respeita ao financiamento climático, Portugal não assegurou, como a ZERO e a Oikos defendem, uma duplicação do financiamento para o Fundo Verde para o Clima (Green Climate Fund). Apesar do comprometimento recente de mais um milhão de Euros, subindo assim para cerca de 3,8 milhões de dólares/ano e do argumento de que há outros financiamentos relacionados com o clima não contabilizados (nomeadamente apoios aos PALOP), o valor ainda é demasiado diminuto.

 

  • Os governos não se esforçaram o suficiente para responder e mostrar aos seus cidadãos

  • Os governos não podem ignorar a enorme mobilização global de opinião pública exigindo uma resposta urgente à crise climática.

  • União Europeia precisa de aumentar substancialmente a sua promessa climática para 2030

  • OIKOS E ZERO insistem em mais fundos internacionais para o clima da parte de Portugal