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Número mais alto de sempre: 274 milhões de pessoas vão precisar de ajuda humanitária em 2022

Serão necessários 36 mil milhões de euros para prestar ajuda, no decorrer do próximo ano, a 183 milhões de pessoas que necessitam de uma assistência urgente em 63 países.

 

Um total de 274 milhões de pessoas em todo o mundo irá precisar de algum tipo de ajuda humanitária em 2022, um aumento de 17% em relação a este ano, alertou a ONU.

A chamada de atenção consta no relatório Panorama Humanitário Mundial 2022 (GHO 2022, na sigla em inglês), apresentado esta quinta-feira a partir de várias capitais do mundo como Genebra, Bruxelas ou Washington.

 

O documento aponta também que serão necessários 41 mil milhões de dólares (36 mil milhões de euros) para prestar ajuda, no decorrer do próximo ano, a 183 milhões de pessoas que necessitam de uma assistência urgente em 63 países, pessoas essas que serão abrangidas pelos 37 planos de resposta humanitária conduzidos pela Organização das Nações Unidas (ONU) e por organizações parceiras.

“Em 2022, um total de 274 milhões de pessoas irão precisar de assistência humanitária e proteção – um aumento significativo em relação aos 235 milhões de há um ano, que já era o número mais alto em décadas”, lê-se no documento.

 

“Notamos um “gap”, ou seja, uma diferença cada vez maior entre aquilo que são as necessidades e a capacidade da comunidade internacional em responder a essas necessidades”, começa por dizer, explicando que isso “leva a que a ação humanitária seja cada vez mais uma ação mediática, emotiva, daquele momento onde acontece a catástrofe, mas ao fim de uns meses toda a comunidade internacional já está noutra latitude e abandona um bocadinho aquelas populações”.

“Isto quer dizer que há muito menos recursos para a ação humanitária e os problemas hoje são maiores” não só devido às catástrofes naturais, mas também “à aceleração em virtude das alterações climáticas, quer de fenómenos extremos, quer de fenómenos que não sendo tão visíveis, são, na verdade, extremamente penalizadores, como as secas prolongadas”, afirma João José Fernandes. “Depois, temos toda a conflitualidade que tem vindo a crescer ao longo dos últimos anos”, acrescenta.

 

João José Fernandes admite que o financiamento não está a acompanhar as necessidades. “Os fundos que aparecem a mais são fundos de empréstimos aos países e, obviamente, que esses fundos não  funcionam em termos de ajuda humanitária”, esclarece.

“Mesmo quando se fala de grandes números para os países em desenvolvimento e para a mitigação e adaptação às alterações climáticas ou para acorrer às vítimas de catástrofes, estamos a falar de fundos que muitas vezes não são suficientes”, refere, sublinhando que “para a ajuda humanitária tem vindo a decrescer a disponibilidade financeira internacional, ou pelo menos não acompanha a proporção do aumento das situações humanitárias no mundo”.

 

“A crise climática está a atingir primeiro e de forma mais grave as pessoas mais vulneráveis do mundo. Os conflitos prolongados continuam e a instabilidade agravou-se em várias partes do mundo, nomeadamente a Etiópia, Myanmar (antiga Birmânia) e Afeganistão. A pandemia não acabou e os países pobres estão privados de vacinas. O meu objetivo é que este apelo global possa contribuir de alguma forma para restaurar uma réstia de esperança em milhões de pessoas que dela necessitam desesperadamente”, afirma o responsável para os Assuntos Humanitários da ONU, Martin Griffiths, sobre o relatório.

 

Entre os vários países referenciados no GHO 2022, a ONU destaca os casos do Afeganistão, do Iémen, da Síria, de Myanmar ou do Haiti, onde “43% da população precisa de ajuda humanitária”.

 

Por exemplo, de acordo com o relatório, no Afeganistão, país sob controlo dos talibãs desde agosto passado, mais de 24 milhões de pessoas necessitam de ajuda, no que será uma “assistência para salvar vidas e para evitar a catástrofe”.

“Isto representa um aumento dramático das necessidades”, realça o relatório, precisando que este panorama está a ser impulsionado por uma combinação de fatores: “Conflitos, Covid-19, tumultos políticos, choques económicos recorrentes e a pior seca dos últimos 27 anos”.

 

Já no Iémen, “apesar dos esforços contínuos para mitigar o risco de fome”, o documento avisa que “a insegurança alimentar continua a ser um desafio crucial”, uma vez que é uma situação que afeta 16,2 milhões de pessoas no país.

“Mesmo com os atuais níveis de assistência humanitária, 40% da população tem uma alimentação inadequada”, refere o GHO 2022, destacando ainda um passo significativo: “No Iémen, os parceiros na área da saúde realizaram mais de 10 milhões de consultas médicas”.

No caso de Myanmar, o relatório estima que 14,4 milhões de pessoas precisam de assistência humanitária, lembrando que o país do Sudeste Asiático enfrenta uma crise política, de direitos humanos e humanitária sem precedentes, “com necessidades que aumentaram dramaticamente desde a tomada do poder pelos militares [em fevereiro passado] e por uma grave terceira vaga da doença Covid-19”.

 

O relatório GHO 2022 enumera ainda outros indicadores preocupantes do atual cenário da ajuda humanitária.

 

“Mais de 1% da população mundial está deslocada. A pobreza extrema está de novo a aumentar. Na maioria das crises, as mulheres e raparigas são as que mais sofrem, uma vez que as desigualdades de género e os riscos de proteção são agravados. A fome continua a ser uma perspetiva aterradora para 45 milhões de pessoas em 43 países”, denuncia o documento, avançando que perante tal panorama, as organizações de ajuda humanitária intensificaram, em 2021, os esforços para tentar conter as piores consequências.

“Através de projetos conduzidos pela ONU, organizações não-governamentais (ONG), Governos e setor privado, 107 milhões de pessoas foram abrangidas, 70% da meta traçada”, prossegue o documento.

 

No campo específico da luta contra a fome – uma meta global que está “perigosamente mal encaminhada” segundo outro relatório internacional recentemente divulgado – o GHO 2022 anuncia que 120 organizações da sociedade civil (das quais cem com sede em países duramente atingidos pelo flagelo) lançam nesta quinta-feira uma carta conjunta dirigida aos líderes mundiais.

Na missiva, as organizações exortam os líderes a financiarem, em pleno, a resposta necessária para prevenir a fome a nível mundial e para enfrentar as principais ameaças que conduzem à insegurança alimentar: conflitos, crise climática, Covid-19 e choques económicos.

 

Global Humanitarian Overview é um relatório sobre a visão geral humanitária global com a avaliação das necessidades humanitárias mais abrangente, confiável e baseada em evidências do mundo. Tem como objetivo combater a fome, a doença e a violência de género, priorizando a urgência da ajuda.

Relatório completo em: gho.unocha.org

 

Fontes: TSF e LUSA; UNOCHA