A Oikos está a dar início a um projeto inovador nas Honduras através de uma aliança inédita com os povos indígenas para a conservação e proteção de áreas marinhas. Com financiamento do Blue Action Fund, a iniciativa irá beneficiar mais de 450 mil pessoas e criar uma zona de conservação gerida diretamente pelos povos Miskitos – os verdadeiros guardiões dos Cayos.
Durante cinco anos, o projeto irá atuar na região dos Cayos Miskito, um ecossistema de importância crítica na costa atlântica das Honduras. Trata-se de uma das maiores extensões de ilhas e recifes de coral da região mesoamericana, com habitats marinhos essenciais para espécies de grande valor ecológico e económico – como peixes, crustáceos e tartarugas marinhas. Esta biodiversidade é a base da subsistência e identidade das comunidades indígenas pesqueiras que habitam esta zona remota e vulnerável.
Contudo, os ecossistemas costeiros e marinhos dos Cayos Miskito enfrentam pressões crescentes. Entre os principais fatores estão a sobrepesca, práticas de pesca destrutivas ou não reguladas, contaminação dos recursos naturais, ausência de regulamentação e fiscalização ambiental, bem como a presença de interesses económicos externos e a violação sistemática dos direitos do povo Miskito.
“É um território de puro desafio, onde só se chega por avião ou lancha. Não há estradas, nem presença do Estado. Há pobreza, discriminação e abandono. Mas é também uma zona de enorme riqueza ecológica e cultural. É aí que entra o nosso compromisso”, afirma Leena, coordenadora regional da Oikos na América Central.
“Alguns chamam-lhes Cayos Miskito, mas para o povo indígena Miskito, são simplesmente os Cayos. São deles. E são eles que devem liderar a sua conservação. O nosso papel é escutar, facilitar e fortalecer”, reforça Leena.
O projeto propõe uma abordagem inovadora de cogestão participativa, assente no reconhecimento do papel das comunidades indígenas como guardiãs dos ecossistemas marinhos. A iniciativa irá trabalhar diretamente com os representantes formais de sete conselhos territoriais indígenas costeiros, promovendo a sua participação ativa em todas as fases da intervenção.
O trabalho de base começou há dois anos com reuniões comunitárias e um levantamento participativo sem precedentes na região. Segundo os líderes locais, foi o processo mais inclusivo alguma vez realizado, dando voz às comunidades e permitindo que fossem identificadas prioridades de ação com base nos seus conhecimentos e aspirações.
“Começámos a trabalhar com estas comunidades há dois anos. Fomos escutar, dialogar, co-construir. Isto mostra que é possível fazer diferente. A conservação dos oceanos tem de ser feita com as comunidades. Este projeto é especial porque aposta em soluções lideradas por quem sempre cuidou da terra e do mar — mesmo sem reconhecimento formal”, sublinha Leena.
Este trabalho colaborativo pretende então:
- Reforçar a governação indígena sobre os recursos naturais;
- Valorizar os saberes tradicionais na gestão marinha;
- Reduzir a dependência exclusiva da pesca;
- Aumentar a resiliência socioecológica face às alterações climáticas e ameaças externas.
Todas as atividades serão implementadas em consórcio com três organizações locais:
- MOPAWI, organização indígena Miskita com intervenção histórica na região;
- ILILI, ONG ambiental hondurenha;
- CDE – Centro de Desenvolvimento Empresarial, responsável por promover soluções económicas adaptadas ao território
“Da Selva para o Oceano” é um projeto que representa um investimento de quase 3 milhões de euros e é o primeiro projeto do Blue Action Fund liderado por uma organização com foco social – a Oikos – cooperação e desenvolvimento – e não por uma ONG ambiental tradicional. Esta aposta marca uma viragem significativa na forma de pensar a conservação: com foco nas pessoas, na justiça e nos direitos humanos, sem descurar a urgência ecológica.
Outro aspeto inovador deste projeto é o trabalho de incidência política e articulação institucional para a criação de marco jurídico nacional que permita sustentar a proteção de território marinho gerido por comunidades indígenas. Esta é uma abordagem sem precedentes nas Honduras e ainda rara a nível internacional, que poderá influenciar futuros modelos de governação marinha inclusiva.
“Este é apenas o começo. Esperamos que este projeto possa inspirar outros — nas Honduras e no mundo — a pensar a conservação de forma mais justa, inclusiva e eficaz. A verdadeira sustentabilidade começa nas comunidades”, conclui Leena.
Ao apostar num modelo de conservação inclusiva e centrada nas comunidades, este projeto pretende mostrar que a conservação ambiental pode — e deve — ser feita com justiça social e protagonismo local.
Veja o testemunho completo de Leena.